O verão está se despedindo neste ano em grande estilo. Até em Curitiba, a capital brasileira mais fria do sul do mundo, tem feito um “calorão”, e isto foi uma das razões que motivaram a escolha da cerveja deste post: uma Witbier. No entanto, é importante observar que enquanto escrevo estas linhas já é outono, e, pelos impulsos geográficos que me impelem, não consigo deixar de considerar a relevância da relação clima, tempo atmosférico e cerveja.

 

Basta o tempo se abrir e o Sol dar o ar de sua graça e a gente se anima para sair passear, andar por aí, parar num bar e tomar uma. Pegar uma praia e se refrescar na brisa a beira mar bebendo uma. Ou, melhor ainda, fazer um churrasco e tomar algumas. As mudanças na estação demarcam alterações no clima e transformam o tempo atmosférico: hora faz frio, ou faz calor, ou faz neblina, ou chove, ou cai canivete de ponta. Há poucos dias ocorreu o equinócio de outono no Hemisfério Sul e, por consequência, o de primavera, no Hemisfério Norte. No passeio elíptico da Terra, trata-se do momento em que o Sol ilumina por igual os dois Hemisférios, proporcionando que o dia e a noite possuam igual duração. Um marco, pois daqui para frente nossos dias aqui no sul do mundo ficarão mais curtos, frios, chuvosos e cinza. Então, aproveitemos o momento e nos deliciemos com cervejas refrescantes, como as Witbiers. Depois, será o momento mais apropriado para outros estilos.

As Witbier, ou simplesmente Witte, para os íntimos, são as cervejas de trigo produzidas pela escola belga (Belgian Witbier), que elabora suas receitas de modo diferente da escola alemã. Os germânicos fazem as Weizenbier, muito populares na região da Bavária, que em linhas gerais apresentam ao menos 50% de malte de trigo em sua composição, possuem corpo acentuado e são ricas em proteínas. Daí uma das razões para que a espuma deste estilo de cerveja seja tão espessa. As Witbier são mais complexas, pois além da base de trigo, levam especiarias em sua composição, como sementes de coentro e cascas de laranja, entre outras. São cervejas de cor clara e opaca, por isso são chamadas de Bière Blanche (cerveja branca), leves, refrescantes, com baixo corpo e amargor, aromáticas, e altamente recomendável para quem está começando a se aventurar pelo universo cervejeiro. Portanto, se você tem um amigo, parente ou conhecido acostumado as populares cervejas lagers da grande indústria, mas que vez ou outra revelam certa curiosidade por novas experiências cervejeiras, indique uma clássica Witbier que não tem erro. Se o sujeito não gostar, relaxe e deixe o destino cuidar da alma da criatura.

A origem das Witbiers remontam a um período há cerca de 400 anos, quando ainda não havia sido descoberto o lúpulo, um dos mágicos ingredientes da cerveja, ressaltados em posts de alguns colegas blogueiros aqui da God: Bruno http://godsavethebeer.com.br/sobre-amor-flores-e-cervejas-amargas/,  e Daniel, http://godsavethebeer.com.br/testando-os-limites-de-uma-ipa/. Para dar mais personalidade, aroma e gosto às cervejas, os belgas adicionavam ingredientes como o coentro e a casca de laranja em suas receitas. Era um estilo muito apreciado naquele período. Entretanto, as Witbier tal como conhecemos hoje tem suas raízes no século 19, quando eram utilizadas pequenas quantidades de lúpulos na receita. Aliás, esta é, ainda, uma das características das receitas atuais. Entretanto, devido a invasão e a procura da população pelas cervejas lagers produzidas pelas grandes indústrias cervejeiras no início do século 20, as cervejarias tradicionais que produziam o estilo acabaram encerrando suas atividades e o estilo Witbier acabou esquecido e por pouco não desapareceu. Todavia, para estarmos falando dele neste momento, é por que alguém não permitiu que desaparecesse. O nome do nosso herói é Pierre Celis, um leiteiro belga, que depois virou cervejeiro, natural de Hoegaarden, um vilarejo situado na região da Flandres. O salvador das Witte faleceu em 2011, com 86 anos, deixando um importante legado. Além de resgatar o estilo, fundou a famosa cervejaria Hoergaarden (www.hoergaarden.com), mas em decorrência de um incêndio na fábrica, foi obrigado a vender sua marca para a Interbrew, que hoje pertence a AB Inbev. Depois disso, mudou-se para os EUA, produziu muitas cervejas colaborativas com cervejarias americanas e fundou a Celis White, uma das mais importantes referências do estilo Witbier.

De leiteiro a cervejeiro, Celis White, o fundador da Hoegaarden

Fazer este estilo de cerveja não é simples, pois a escola belga é muito exigente, principalmente no processo de fermentação. Talvez isto explique o fato das cervejarias brasileiras terem começado a investir neste estilo mais recentemente. Até pouco tempo atrás, era difícil encontrar a venda uma Witbier feita no Brasil. Somente os cervejeiros caseiros se aventuravam na fabricação do estilo.

Felizmente algumas cervejarias nacionais começaram a investir na produção das Witbiers, colocando o estilo em suas linhas de produção. Entre elas, a Cervejaria Way Beer (www.waybeer.com.br), localizada em Pinhais/PR, na região metropolitana de Curitiba. Esta jovem cervejaria, que iniciou suas operações em 2010, se destaca no cenário cervejeiro brasileiro pela ousadia e criatividade, além da qualidade de suas cervejas, predicados que a conduziram ao prêmio de melhor cervejaria brasileira do ano de 2014 pelo Rate Beer, um site norte-americano especializado em cervejas.

O espírito empreendedor de seus fundadores se evidencia pela variedade de rótulos da cervejaria, sempre apresentando novidades para seus clientes, mesmo que alguns estilos produzidos ainda não tenham caído no gosto popular. Mas além disso, vale destacar suas estratégias de mercado, que entre outras ações, passou a exportar cerveja para outros países, como os EUA. Sim, a Way está desembarcando na terra do Tio Sam! No campo da inovação, recentemente trouxe para o Brasil novidades como o Crowler, uma forma de adquirir cerveja fresca em embalagem descartável e reciclável. Além disso, merece destaque a sua logomarca e a criatividade de seus rótulos, serigrafados nas garrafas.

Depois desta não tão breve, mas necessária introdução, vamos as minhas impressões acerca da Way Witbier.

Clássica garrafa “caçulinha” com 310 ml

Trata-se de uma cerveja leve, refrescante e aromática, formando um tripé equilibrado que garante alta drinkability. No copo, sua cor é um dourado claro e opaco, apresentando uma espuma discreta, conforme manda o figurino das Bière Blanche. No olfato, é possível perceber as especiarias utilizadas na receita, predominando os aromas cítricos. Também pudera, entre os ingredientes, foram adicionados: limão siciliano, capim limão e camomila. Some-se a isso, a utilização do sorachi ace, um lúpulo de origem japonesa que virou mania entre os cervejeiros brasileiros e que tem como principal característica o aroma cítrico, com traços de limão. Na boca, leveza, refrescância e baixo amargor. Segundo os próprios fabricantes, se você quiser harmonizar com comida, esta Witte combina com frutos do mar, sashimi, ceviche e tartare de salmão.

Enfim, a Way Witbier é uma cerveja para se beber litros. E isto é possível, pois além das garrafas do tipo “caçulinha”, com 310 mililitros, a cervejaria passou a disponibilizar no mercado garrafas de 1 litro. Um litrão que desce redondo de verdade. Mas, antes do gole, não esqueça de dar aquela “fungada” no copo para sentir seus ricos aromas cítricos. Para não esquentar o líquido precioso, caso a sede não seja tão grande, recomendo dividir a garrafa com um amigo. Só para constar, lembro que estou na área. Aproveite e me chame logo, antes que chegue o inverno.

Abraços acalorados a todos!